Colunistas - Paulo Wainberg

Quando o artista se mata...

  • Quando o artista se mata eu entendo muito bem, porque há o desejo permanente de morte por trás de cada obra criada.
  • Desejo de morte pela incapacidade de compreender o Todo e pela capacidade de compreender a fugacidade de sua obra.
  • Desejo de morte por não suportar o fim do prazer e por jamais atingir o pleno prazer.
  • O artista, quando se mata, morreu antes, incapaz de suportar a ausência da fama, do sucesso, incapaz de conviver com a fama e o sucesso.
  • Mata-se por que não suporta mais a ansiedade alheia, o medo de não agradar e, o que é dramaticamente depressivo, a eterna comparação com ele mesmo.
  • Quando se mata, o artista atingiu a plenitude da ansiedade, do pânico de palavras como gostei e não gostei, de começar tudo de novo após cada obra, o artista se mata porque não compreende e não tolera mais a própria insuficiência.
  • O suicídio do artista é a confissão pungente de que não acredita mais, nele e em ninguém, na sua obra e na sua alma e que por isto a vida lhe terminou.
  • Quando o artista se mata é triste, é o carimbo de reconhecimento oficial da dor que a arte lhe causou.
Última atualização em Qui, 22 de Maio de 2014 14:18
 

Reino do medo

  • No Reino do Medo as cores são incolores e a mais constante é o chumbo escuro.
  • No Reino do Medo as pessoas ameaçam, os dias são um calvário, o sono é pesadelo, despertar é desgraça e alegria é alergia.
  • No Reino do Medo tristeza é imperatriz, susto é bobo da corte e estômago o quartel general da angústia.
  • No Reino do Medo a verdade não importa e esconde-esconde é o brinquedo favorito.
  • Quem visita o Reino do Medo quase nunca sai de lá, preso na teia monumental sobrevoada por mil moscas varejeiras.
  • No Reino do Medo é impossível amar, é impossível gostar, só é possível temer.
Última atualização em Qua, 07 de Maio de 2014 09:14
 

Agruras de um vovô recém-nascido

Nos dias atuais, vocês não fazem idéia do quanto é difícil para um avô, ficar com sua netinha no colo, nem que seja por cinco minutos.

Esse avô chega em casa, do trabalho, sonhando em segurar a pequenina, dizer xoxoxô, golegolegole, passar o dedo no queixo, dizer pipipopó
com voz fina e se deliciar com o sorriso dela. Mal estende os abraçose uma das circunstantes ordena: lavar as mãos, passar gel nas mãos,
escovar os dentes, pentear os cabelos, tirar o casaco e lá vai o vovô,obediente, cumprir as determinações. Quando volta, ansioso, acircunstante mor, a mãe da menina, diz que agora não, ela vai mamar,agora não, ela acabou de mamar, agora não ela precisa arrotar, agora não ela vai regurgitar, agora não ela tá cocô, agora não porque agora não.

 

 

Após muita súplica, apelos pungentes e preces dolorosas, deposita a se no
A circunstante sênior, a vovô, logo em seguida estende os braços sequiosos e, com um sorriso cativante, pede para pegar a nenê um pouquinho.

 

E, me respondam, como vai esse vovô dizer que não?

E, não sem pesar, deposita a Luiza nos braços da avó, restando-lhe a alegria de rodear a dupla, enternecido e abobadamente feliz em, pelo menos,
admirar a cena. Enquanto isto a circunstante mor mantém seu rígido controle: levanta a cabeça, baixa a cabeça, inclina para cima, tapa as
perninhas. E nós obedecemos.

  • O que as circunstantes não sabem é que este vovô quer apenas adorar a Luiza enquanto se embriaga com seu perfume de nenê.

 

Última atualização em Ter, 25 de Março de 2014 14:33
 

Para dar e vender

  • Hoje o dia está especialmente emocionante, não sei a razão.
  • Ofereci três lágrimas amargas em troca de um sorriso doce, mas pode ser um olhar amigo, com efeito o mesmo efeito.
  • Não estou, porém, sendo honesto, eis que não disponho de três lágrimas amargas para ofertar, minhas lágrimas estão secas, estão chorando para dentro, mal umedecem meus olhos e quase não brilham meu olhar.
  • Mas o truque se perdoa pelo desejo do sorriso doce, do olhar amigo, essas sim, coisas capazes de me emocionar, especialmente no dia emocionante de hoje em que tudo o que penso se transforma em acordes, tudo o que vejo tem gosto de coisa boa, tudo o que toco está mais do que afinado.
  • Emoções sem causa são genuínas, vêm do interior e dispensam estímulos. O bem estar é como o estágio de um estado acima, onde esquecimento, paixão e dor não têm espaço, ocupado que está por lindas memórias, incontáveis amores e prazeres olímpicos.
  • Pudera fossem meus dias sempre assim, como o de hoje, especialmente emocionante, paz e alegria para dar e vender.
Última atualização em Sex, 28 de Fevereiro de 2014 11:31
 

O que dizem ao ateu

  • O Imbecil:
  • - Não acredita em Deus? Então é porque Ele existe.
  • O Psicólogo:
  • - Na prática, o que isto está atrapalhando a sua vida?
  • O Padre:
  • - Penitência e arrependimento, meu filho, são os caminhos seguros para o céu.
  • O de esquerda:
  • - Quanto ao mito sim, mas como técnica de globalização e e produto de consumo dos Estados Unidos, não.
  • O da direita:
  • - Comunista!
  • Outro ateu:
  • - O meu ateísmo é mais poderoso do que o seu.
  • O rabino:
  • - Não acredita nele? Não se preocupe, Ele acredita em você.
  • O cínico:
  • - Quero ver esse ateísmo todo quando chegar a hora agá!
  • O hipócrita:
  • - Eu também, mas como queria acreditar.
  • O pastor evangélico:
  • - Demônio, abandona este corpo que não te pertence. Pronto, cem mil em dinheiro, o resto pode ser em imóveis.
  • A socialite:
  • - Como assim, não acredita? Não viu o filme os Dez Mandamentos?
  • O psiquiatra:
  • - Existe um novo medicamento, um antidepressivo que vai acabar com esse sintoma.
  • O filósofo:
  • - Não acreditar é irrelevante. O que importa é não perder as perspectivas oncológicas.
  • O canalha:
  • - Não acredita em quem????
  • O intelectual:
  • - Concordo, é uma farsa, porém poderosa, tão poderosa que determina a interação humana, do mais simples ao mais complexo.
  • O pragmático:
  • - Melhor com do que sem.
  • Inquilino:
  • - Não me surpreende, só um desalmado para cobrar um aluguel desses.
  • O psicanalista:
  • - Você resiste tanto ao tratamento que está negando minha existência.

 

Última atualização em Ter, 18 de Fevereiro de 2014 13:41
 


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