Mal nasci, levei uma palmada na bunda, como se tivesse feito algo proibido. Dói até hoje essa palmada, desferida por um estranho, num mundo para o qual não pedi para ir.
Vivia muito bem, lá onde estava. Era quentinho, agradável, quase nenhuma turbulência, comida abundante, dormia a qualquer hora e não tinha compromisso.
De repente me puxaram pela cabeça e entre no parafuso cósmico que me fez viajar milhares de anos-luz pelo Universo e, como recompensa, uma palmada na bunda.
No primeiro momento, estranhei, não sabia o que era dor.
A sensação foi diferente de tudo o que experimentara e, para completar, senti uma enorme dificuldade para respirar.
Abri os olhos e não entendi nada, a dor na bunda me incomodava, a falta de ar me incomodava e fiz o que me restava saber, na tentativa louca de compreender e sobreviver: Abri o berro.
Sufoco e dor foram minhas primeiras experiências neste mundo.
Nunca mais consegui voltar ao meu planeta de origem, passei a vida tentando, recebi explicações de todo o tipo e ninguém respondeu à única pergunta que eu tinha: Por que me trouxeram para cá, se eu não queria vir.
Até hoje não me conformo com tamanho desaforo, falta de consideração e ofensa aos meus direitos humanos.
Em busca de consolo, imagino que outro ser, algum dia, me pegue pela cabeça, me coloque no parafuso cósmico e me encaminhe para outro mundo, melhor do que este.
Mas o consolo me sai pela culatra, que tipo de experiências terríveis terei que suportar, nos primeiros segundos do novo mundo?