Querem proibir o email

Li no jornal: O Deputado Federal Aldo Rabello, líder do novíssimo Partido Comunista, está fazendo um projeto de lei para proibir o uso, por escrito, de palavras estrangeiras no Brasil.



Idéia magistral, como é que não pensei nisso antes? Como é que outros deputados e senadores não pensaram nisso antes, neste País? Há quinhentos e onze anos o Brasil vem incorporando essas horrorosas palavras em inglês, francês, alemão, japonês, italiano, causando gravíssimos danos à função social da língua portuguesa e ninguém fez nada!

Como se sabe, a língua pátria é condição necessária para a formação de uma nação. Entretanto, ao longo dos séculos, invasores de língua querem retirar nossa identidade, introduzindo solertemente suas estrangeiras palavras em nossos textos, abalando de forma radical o nosso nacionalismo que, finalmente, graças aos ideais comunistas do ínclito deputado, será doravante salvo.

Imaginem a alegria que sentiremos nós, brasileiros, quando formos proibidos de escrever Internet, substituindo o terrível termo pelo brasileiríssimo Entre a Rede.

O Twitter será eliminado, pois não há palavra para ele, em português.

E-mail? Minha querida, recebeste a correspondência eletrônica que te enviei ontem?

Você nunca mais manejará um mouse e terá, para todo o sempre, um camundongo em sua mão.

O locutor não gritará o horrendo gol, que será substituído por... por ‘a esfera ingressou na área posterior às traves e o travessão’.

Sua casa não terá mais ladrilhos e sim pequenos pedacinhos de pedra colorida.

E isto que estou simplificando, há situações muito mais complexas que o nacionalismo deve proteger à todo o custo, quando se trata de defender a língua mãe.

Ai de quem se atrever a digitar marqueting no trabalho de conclusão de concurso. Um bom e verdadeiro brasileiro substituirá a palavra alienígena por algo bem mais simples, como ‘a estrutura de divulgação, interação, empatia e divulgação das atividades mercadológicas visando dar conhecimento de produtos e atividades específicas ou gerais’.

Se um escritor como eu descrever a despedida de seu personagem francês com um ‘au revoir’, será imediatamente preso!

E não tomarei mais seu tempo com exemplos. Passo a identificar a motivação que levou o parlamentar à conceber um absurdo tamanho.

A primeira coisa que me ocorre é que ele não tem mais nada para pensar. Absolutamente nada. E solidário com seus pares parlamentares, que também não pensam em nada além de negócios rendosos, resolveu ocupar-lhes a mente.

Imagino nossas Casas Legislativas lotadas, em sessões solenes e intermináveis, onde nossas excelências debaterão a matéria à exaustão, estudando, vernáculo a vernáculo, o que pode e o que não pode ser escrito neste país.

Pense nos puristas parlamentares, exultantes com o debate, revelando seu extraordinário pensamento, as linhas de raciocínio, os apartes pro bono (acabo de me arriscar, escrevendo em latim), os a favor, os contra, um espetáculo brasileiro de democracia, não importa que a corrupção corra solta e que mais de sete mil pessoas trabalhem para oitenta senadores, ganhando o salário pagos por nós, que odiamos palavras estrangeiras escritas por incultos professores, artistas, jornalistas, poetas, escritores, filósofos e outros entreguistas que assolam a Nação.

Perceba a grandeza do projeto!

Outro motivo que pode ter levado o velho Aldo à conceber a coisa pode ser a arteriosclerose, palavra que nem sei se brasileira é.  

Imaginando-se, por confusão mental, estar sob a influência (ou domínio) do Império Romano e percebendo que o Latim virou latim vulgar, aquele falado nos países conquistados, misturados com as línguas pátrias, entrou em crise de nervos.

Esquecendo-se de que o Português deriva do latim vulgar, quer o nobre que preservemos, como se fôssemos uma raça, a pureza absoluta, abolindo da nossa escrita tudo aquilo que não for contemplado na língua de Virgilio.

“Mensalão”, por exemplo, é permitido?

Você, garota, jamais seja fashion. Arrisca-se aos piores rigores da lei.

Enfim!

Um País como o nosso, sem problemas, onde as instituições funcionam como um relógio suíço, a honestidade é absoluta, escândalos não existem, crimes não são cometidos, a segurança é perfeita, as estradas são ótimas, a educação é a melhor do mundo, a Saúde Pública é maravilhosa, o sistema político é exemplar, o problema social não existe e a riqueza é distribuída com absoluta justiça, tem mesmo é que se preocupar com palavras estrangeiras.

Eu, olhando aqui debaixo, já estou me preparando para nunca mais escrever non sense. Corro o risco de ser condenado a não sei quantos anos de prisão.
 
Copyright © 2011 Acontece Curitiba. Todos os direitos reservados. Desenvolvido por LinkWell.