Deadline e o Relógio do Sol



Deadline. É o fim da linha. É o prazo final. Os empresários usam muito essa palavrinha. Os jornalistas também.

E falando neles, imagine que você é um jornalista e precisa escrever uma matéria sobre um tal de “relógio do sol”. Permita-me ser mais específico: você é jornalista, precisa fazer uma matéria sobre o tal do relógio do sol, mora em CURITIBA (cidade das quatro estações em um dia) e sua deadline está se aproximando.

Sinceramente, eu preferia ter ido fazer uma matéria sobre incidência de cáries em cães hidrófobos. Seria mais fácil das coisas darem certo.

Em primeiro lugar, eu nunca tinha SEQUER ouvido falar que na praça Tiradentes tinha o bendito de um relógio do sol. Eu nem ao menos sabia o que era um relógio do sol (e olha que sou neto de relojoeiro!).

A única coisa que eu sabia é que o tal relógio fica entre a loja Xiquita e a Pernambucanas.  Esse era todo o meu conhecimento sobre o relógio do sol. Brilhante.

Cheguei na praça Tiradentes, me aproximei da Xiquita e fiquei olhando pra cima, como quem tenta avistar um OVNI. Não vi nenhum relógio. Na calçada, tampouco (sim, porque imaginei se o relógio não poderia ser uma daquelas Rosa dos Ventos, sabe?). Perguntei então para um senhor que ali passava:


- O senhor sabe onde fica o relógio do sol?

- Você quer saber que horas são? – me perguntou.

- Não, não, o re-ló-gio do sol. Quero tirar uma foto dele e...

- São meio dia e vinte.


Agradeci o doido e resolvi fuçar por conta própria. Entre a Xiquita e a Pernambucanas, entre a Xiquita e a Pern...

Ah, ali estava.

O que a preguiça não faz, não? Alguns passinhos para o lado e avistei o relógio. E devo dizer que foi simpatia à primeira vista.

O relógio está localizado um pouco a esquerda da loja Xiquita, acima e no meio de três janelas de um pequeno prédio histórico de Curitiba. A fachada é branca (ou melhor dizendo, já foi branca).

No blog “circulando por Curitiba”, há uma informação sobre o prédio: Farmácia Stellfeld, a primeira de Curitiba, aberta em 1857 por Augusto Stellfeld, situava-se na Santa Casa de Misericórdia. Em 1866, o estabelecimento foi transferido para a Praça Tiradentes, na quadra em frente à catedral.

A primeira coisa que tentei fazer, evidentemente, foi tentar ver as horas no relógio do sol. Não tive sucesso. Na parte de cima do relógio pode-se ler a data (1857), que foi o único número ali que ficou claro pra mim. De resto, uma confusão só: o 12 lá embaixo, o 1 a esquerda, o 6 na ponta superior esquerda, o 7 na outra ponta e eu lá embaixo, com cara de bobo. Para mim pareceu mais fácil montar o cubo mágico de Rubik do que decifrar as horas no relógio do sol. Senti-me um completo ignorante, mas tentei atribuir essa sensação a falta de ponteiros no relógio. Os ponteiros, presumi, devem ser as sombras projetadas pelo sol ao incidir diretamente sobre o relógio. O céu nublado, apesar do calor tórrido, não ajudou. Preferia um tempo mais aberto, mas enfim, é a deadline, é a deadline...

Para concluir minha missão, escolhi aleatoriamente algumas pessoas por ali para saber o que elas pensavam sobre o relógio do sol (implicando que elas soubessem da existência dele).

Eliseu Gaiser é taxista e costuma rondar a praça Tiradentes todos os dias. Ele sabia perfeitamente que havia um relógio do sol ali na praça, mas não exatamente aonde. Apontei o relógio pra ele e ele ficou olhando, curioso...


- Mas que horas são? – perguntou.

- Pois é. – respondi, frustrado. – Também não sei.

- Peraí. – disse ele e tirou o celular do bolso. – Meio dia e trinta cinco.

- Ah, muito obrigado.


É por isso que dizem que em Curitiba você tem que se esforçar pra ser esquisito.

Já Carlos Alvez, gari (e aqui vou parafraseá-lo), comentou que sim, sabe do relógio do sol, mas não consegue entender o troço.

Tive vontade de abraçá-lo e dizer: “eu também não, Carlos, eu também não!”.

E Luana Aragão, estudante da 8° série, me disse que o pai já havia lhe mostrado o relógio quando ela ainda era criança. Na opinião dela, o relógio é mais interessante do que útil.

Concordei. É um patrimônio histórico. Um elo com o passado, muito antes da era dos celulares e relógios digitais. Um relógio (aparentemente) pouco conhecido pelos curitibanos. Você passa por ele despercebido, seu olhar está focado em outras coisas: o itinerário dos ônibus, as pessoas, o som da catedral, as pessoas, as promoções da Xiquita, as pessoas. Você passa pelo relógio solar e não se dá conta de que ele está ali e do quanto ele faz parte desta cidade.

Em suma, ele é como o Dalton Trevisan. Só que um pouco menos confuso.



Diego Gianni

(março de 2012)

Última atualização em Qua, 04 de Abril de 2012 09:04  
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